terça-feira, 28 de julho de 2009

Não há Imposto de Renda sobre indenizações por danos morais e materiais

Acórdão do STJ

RECURSO ESPECIAL Nº 1.068.456 - PE
RELATORA:MINISTRA ELIANA CALMON
RECORRENTE:FAZENDA NACIONAL
PROCURADORES: CLAUDIO XAVIER SEEFELDER FILHO E OUTRO(S) - THALLES FIGUEIREDO SOARES DA SILVA E OUTRO(S)
RECORRIDO :FLÁVIO ROBERTO FALCÃO PEDROSA
ADVOGADA: CRISTIANA GESTEIRA COSTA E OUTRO(S)

EMENTA

TRIBUTÁRIO - IMPOSTO DE RENDA - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - NATUREZA DA VERBA - ACRÉSCIMO PATRIMONIAL - NÃO-INCIDÊNCIA - PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL - PRECEDENTES DO STJ.

1. A indenização por danos materiais e morais não é fato gerador do imposto de renda, pois limita-se a recompor o patrimônio material e imaterial da vítima, atingido pelo ato ilícito praticado.

2. A negativa de incidência do imposto de renda não se faz por força de isenção, mas em decorrência da ausência de riqueza nova – oriunda dos frutos do capital, do trabalho ou da combinação de ambos – capaz de caracterizar acréscimo patrimonial.

3. A indenização por danos morais e materiais não aumenta o patrimônio do lesado, apenas o repõe, pela via da substituição monetária, ao statu quo ante.

4. Quanto à violação do artigo 535 do CPC, esclareça-se que, em nosso sistema processual, o juiz não está adstrito aos fundamentos legais apontados pelas partes. Exige-se, apenas, que a decisão seja fundamentada, conforme o convencimento do julgador.

5. No caso, o magistrado aplicou a legislação por ele considerada pertinente, fundamentando o seu entendimento e rejeitando as teses defendidas pelo ora recorrente, não havendo que se falar em deficiência na jurisdição prestada.

6. Recurso especial não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça "A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins, Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília-DF, 18 de junho de 2009 (Data do Julgamento)

MINISTRA ELIANA CALMON
Relatora

RECURSO ESPECIAL Nº 1.068.456 - PE (2008⁄0140779-2)

RECORRENTE:FAZENDA NACIONAL
PROCURADORES:CLAUDIO XAVIER SEEFELDER FILHO E OUTRO(S)
THALLES FIGUEIREDO SOARES DA SILVA E OUTRO(S)
RECORRIDO :FLÁVIO ROBERTO FALCÃO PEDROSA
ADVOGADO:CRISTIANA GESTEIRA COSTA E OUTRO(S)

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: Trata-se de recurso especial interposto com base na alínea "a" do permissivo constitucional pela FAZENDA NACIONAL contra acórdão assim ementado:

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. NÃO INCIDÊNCIA.
1. Os valores recebidos em decorrência de indenização por danos morais e materiais não caracterizam acréscimo patrimonial. É tão-só forma de recomposição de um prejuízo material e⁄ou moral sofrido, não configurando, pois, fato gerador do Imposto de Renda, na forma referida no art. 43 do Código Tributário Nacional - CTN. Precedentes jurisprudenciais.
2. Não é possível, em sede de Apelação, discutir questões que não foram suscitadas na contestação, mas, somente, no recurso.
3. É pacífico o entendimento no sentido de que, na restituição de tributos, seja por repetição em pecúnia, seja por compensação, são devidos juros de mora a partir do trânsito em julgado, nos termos do art. 167, parágrafo único, do CTN e da Súmula 188⁄STJ.
4. Inexiste norma legal que impeça o Juiz, ao proferir sua decisão, de adotar como razões de decidir a fundamentação consignada em outro julgado, podendo valer-se dos fatos, provas, aspectos pertinentes ao tema, legislação, doutrina e jurisprudência que julgar aplicáveis ao caso concreto. Princípio do livre convencimento.
5. Verba honorária que foi fixada segundo apreciação eqüitativa, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo 3º, do art. 20 do CPC.. Apelação e Remessa Oficial providas, em parte. (Fl. 76)

Os embargos de declaração opostos foram parcialmente providos.

No recurso especial, alega violação aos seguintes dispositivos de lei federal:

a) art. 535, II, do CPC, ao argumento de que não teriam sido sanados vícios constantes no acórdão recorrido;

b) art. 43 e 114 do CTN, uma vez que o valor recebido a título de indenização por danos morais e materiais configura fato gerador de imposto de renda, pois caracteriza acréscimo patrimonial; e

c) arts. 97, I, e 111, I, do CTN, tendo em vista que a matéria sobre extinção de tributos deve ser realizada pela lei.

Sem contrarrazões, subiram os autos. É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (Relatora): A questão que se coloca no recurso especial, em sede de ação de repetição de indébito, é a incidência do imposto de renda, retido na fonte, sobre os valores recebidos em decorrência de indenização por danos morais e materiais, embora não haja nos autos indicação dos fatos que teriam originado essa indenização.

Primeiramente, verifico que o acórdão recorrido, ao contrário do que alega a recorrente, não incorreu em vícios que indiquem violação do art. 535 do CPC. O julgamento do Tribunal a quo embasou-se em razões suficientes para sustentá-lo, dando solução jurídica à questão trazida pela recorrente.

Os órgãos do Judiciário não estão adstritos às teses trazidas pelas partes. Eles podem formar o seu conhecimento com base em todos os elementos constantes na causa, bastando, para tanto, que fundamentem a posição que adotarem, o que ocorreu no caso. Por essa razão, o recurso especial não pode ser provido neste ponto.

Quanto à caracterização das indenizações como renda, é preciso fazer algumas considerações a respeito da natureza jurídica dos danos morais e materiais.
De acordo com a jurisprudência desta Corte, dano moral é "tido como lesão à personalidade, ao âmago e à honra da pessoa" (REsp 85019⁄RJ, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, julgado em 10.03.1998, DJ 18.12.1998).
Na Primeira Seção deste Tribunal, é majoritário o entendimento de que as indenizações relativas a dano moral estão fora do campo de incidência do imposto de renda.
Após posicionamento da seção passaram as turmas a seguir a mesma orientação como demonstram os arestos seguintes:

TRIBUTÁRIO – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – SENTENÇA CONDENATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO – RETENÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA NA FONTE – IMPOSSIBILIDADE – NATUREZA INDENIZATÓRIA DA VERBA – NÃO-INCIDÊNCIA DO TRIBUTO – PRECEDENTES – RECURSO ESPECIAL – SEGUIMENTO NEGADO – AGRAVO REGIMENTAL – AUSÊNCIA DE RAZÕES PARA INFIRMAR A DECISÃO AGRAVADA.

1. Inexistem razões para modificar o entendimento assentado na decisão agravada, porquanto não há como equiparar indenizações com proventos, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos nas hipóteses anteriores, uma vez que a indenização torna o patrimônio lesado indene, mas não maior do que era antes da ofensa ao direito.
Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 869.287⁄RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 17.05.2007, DJ 31.05.2007 p. 422).

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANO MORAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO. RETENÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA NA FONTE PELA ENTIDADE PAGADORA. IMPOSSIBILIDADE. PARCELA CUJA NATUREZA É INDENIZATÓRIA. NÃO-INCIDÊNCIA DO TRIBUTO. RECURSO IMPROVIDO.
A incidência de tributação deve obediência estrita ao princípio constitucional da legalidade (artigo 150, inciso I). O Código Tributário Nacional, com a autoridade de lei complementar que o caracteriza, recepcionado pela atual Carta Magna (artigo 34, parágrafo 5º, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias), define o conceito de renda e o de proventos de qualquer natureza (artigo 43, incisos I e II).

Não há como equiparar indenizações com renda, esta entendida como o fruto oriundo do capital e⁄ou do trabalho, tampouco com proventos, estes tidos como os demais acréscimos patrimoniais, uma vez que a indenização torna o patrimônio lesado indene, mas não maior do que era antes da ofensa ao direito. Não verificada a hipótese de incidência do imposto de renda previsto no art. 43 do CTN.

Reconhecida a alegada não-incidência do tributo em debate sobre as verbas da reparação de danos morais, por sua natureza indenizatória, não há falar em rendimento tributável, o que afasta a aplicação do art. 718 do RIR⁄99 na espécie em comento.
Recurso especial ao qual se nega provimento. (REsp 402.035⁄RN, Rel. Ministro FRANCIULLI NETTO, SEGUNDA TURMA, julgado em 09.03.2004, DJ 17.05.2004 p. 171, grifei).

TRIBUTÁRIO - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA - IMPOSSIBILIDADE - CARÁTER INDENIZATÓRIO DA VERBA RECEBIDA.
1. As verbas indenizatórias que apenas recompõem o patrimônio do indenizado, físico ou moral, tornam infensas à incidência do imposto de renda. Aplicação do brocardo ubi eadem ratio ibi eadem dispositio.
2. Precedentes.
3. Recurso improvido. (REsp 410.347⁄SC, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07.11.2002, DJ 17.02.2003 p. 227).

Diante do posicionamento jurídico sobre a questão, entendo que os valores decorrentes de indenização por danos morais não acarretam acréscimo patrimonial e, por isso, não se sujeitam à incidência do imposto de renda. Tal entendimento foi fixado recentemente pela Primeira Seção desta Corte:

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NATUREZA DA VERBA. ACRÉSCIMO PATRIMONIAL. NÃO-INCIDÊNCIA. PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL. PRECEDENTES DO STJ.
1. A indenização por dano estritamente moral não é fato gerador do Imposto de Renda, pois limita-se a recompor o patrimônio imaterial da vítima, atingido pelo ato ilícito praticado.
2. In casu, a negativa de incidência do Imposto de Renda não se faz por força de isenção, mas em decorrência da ausência de riqueza nova – oriunda dos frutos do capital, do trabalho ou da combinação de ambos – capaz de caracterizar acréscimo patrimonial.
3. A indenização por dano moral não aumenta o patrimônio do lesado, apenas o repõe, pela via da substituição monetária, in statu quo ante.
4. A vedação de incidência do Imposto de Renda sobre indenização por danos morais é também decorrência do princípio da reparação integral, um dos pilares do Direito brasileiro. A tributação, nessas circunstâncias e, especialmente, na hipótese de ofensa a direitos da personalidade, reduziria a plena eficácia material do princípio, transformando o Erário simultaneamente em sócio do infrator e beneficiário do sofrimento do contribuinte.
5. Recurso Especial não provido. (REsp 963387⁄RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08⁄10⁄2008, DJe 05⁄03⁄2009)


A indenização por dano moral não é fato gerador do imposto de renda, pois limita-se a recompor o patrimônio imaterial da vítima, atingido pelo ato ilícito praticado. Da mesma forma, o dano material visa à mera recomposição do patrimônio da vítima que foi ilegalmente atingido pelo evento danoso. Confira-se a jurisprudência:

DIREITO CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS DECORRENTES DE ACIDENTES DE VEÍCULOS. TRANSAÇÃO CELEBRADA PELAS PARTES INSTITUINDO PENSIONAMENTO, MEDIANTE INCLUSÃO EM FOLHA DE PAGAMENTO MENSAL. RETENÇÃO INDEVIDA DE IMPOSTO DE RENDA NA FONTE.
Diante de transação em que as partes instituem pensionamento mensal, com inclusão em folha de pagamento, pondo fim a demanda indenizatória, os pagamentos conservam a natureza indenizatória da origem da obrigação, não havendo fundamento para retenção do imposto de renda na fonte. Recurso Especial provido.
(REsp 1012843⁄RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05⁄11⁄2008, DJe 17⁄02⁄2009)

TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSTO DE RENDA. RETENÇÃO NA FONTE. APOSENTADORIA COMPLEMENTAR MÓVEL VITALÍCIA (ACMV).
RECEBIMENTO ANTECIPADO. NATUREZA INDENIZATÓRIA. NÃO INCIDÊNCIA DO TRIBUTO.
As verbas pagas a título de recebimento antecipado da Aposentadoria Complementar Móvel Vitalícia (ACMV), a exemplo do que ocorre nos programas de incentivo à dissolução do pacto laboral, aposentadoria incentivada ou de demissão voluntária, tem natureza indenizatória, porquanto representa ressarcimento e compensação das perdas sofridas pelo aposentado, não cabendo incidir sobre elas o imposto de renda. Recurso improvido.
(REsp 414.388⁄MG, Rel. Ministro GARCIA VIEIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10⁄09⁄2002, DJ 18⁄11⁄2002 p. 163)

Ao negar a incidência do imposto de renda, não se reconhece a isenção, mas a ausência de riqueza nova - oriunda dos frutos do capital, do trabalho ou da combinação de ambos - capaz de caracterizar acréscimo patrimonial.

A indenização por dano moral ou material não aumenta o patrimônio do lesado, sendo voltada à restituição, pela via da substituição monetária, da situação em que a vítima se encontrava antes do evento danoso.

Para incidir o imposto de renda é preciso que o fato gerador represente uma atividade proveniente do trabalho ou da aplicação do capital ou de ambos. Em outras palavras, é preciso que haja efetiva geração de riqueza.

A geração de riqueza é a tônica de qualquer modelo capitalista. Ninguém dirá que é, efetivamente, uma atividade importante no mercado a geração de riquezas por meio de danos morais ou materiais. Eles são uma reparação a uma lesão ilegal ao patrimônio jurídico da vítima, seja material ou imaterial. Não vejo como se chegar à conclusão de que dano moral e material não ocasionam indenização. E se é indenização, não pode ser objeto de imposto de renda. Se fosse possível reparar o dano de outra forma, não haveria a indenização em valores pecuniários.

Com essas considerações, nego provimento ao recurso especial. É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA TURMA
Número Registro: 2008⁄0140779-2REsp 1068456 ⁄ PE

Números Origem: 200083000200633 200705001042795 200800561078

PAUTA: 18⁄06⁄2009JULGADO: 18⁄06⁄2009

Relatora
Exma. Sra. Ministra ELIANA CALMON

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro CASTRO MEIRA

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. CARLOS EDUARDO DE OLIVEIRA VASCONCELOS

Secretária
Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI

AUTUAÇÃO

RECORRENTE:FAZENDA NACIONAL
PROCURADORES:CLAUDIO XAVIER SEEFELDER FILHO E OUTRO(S)
THALLES FIGUEIREDO SOARES DA SILVA E OUTRO(S)
RECORRIDO:FLÁVIO ROBERTO FALCÃO PEDROSA
ADVOGADO:CRISTIANA GESTEIRA COSTA E OUTRO(S)

ASSUNTO: Tributário - Imposto de Renda

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Sra. Ministra-Relatora."
Os Srs. Ministros Castro Meira, Humberto Martins, Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília, 18 de junho de 2009

VALÉRIA ALVIM DUSI
Secretária

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